Pragas também querem chegar ao pódio na Olimpíada

Evento esportivo aumenta a possibilidade da entrada de mais de 1000  pragas exóticas, escondidas em produtos in natura trazidos ilegalmente nas malas dos visitantes

Daniel Popov, de São Paulo
Mais de 1 milhão de visitantes são esperados para acompanhar os Jogos Olímpicos deste ano, que acontecem no Rio de Janeiro. Com eles, além da alegria e empolgação pelo evento, chegam também alguns riscos ocultos, que podem afetar a agropecuária brasileira. Isso porque o país fica exposto a centenas de ameaças fitossanitárias, trazidas proposital ou involuntariamente pelos turistas. Segundo estudo realizado pela consultoria em Defesa Agropecuária e Inteligência Estratégica Oxya, ao abrir as portas para turistas de mais de 200 países, o Brasil fica vulnerável à entrada de milhares de pragas exóticas.

Um pequeno ramo de lavanda para eternizar uma viagem inesquecível, uma fruta deliciosa trazida para um parente querido, ou até mesmo uma cabeça de ovelha ressecada para sacanear aquele amigo do trabalho. Seja qual for a intenção, em todos os casos descritos o risco de introdução de uma praga inexistente no país é enorme, garante a professora e diretora da Oxya Regina Sagayama. “O Ministério da Agricultura (Mapa) já apreendeu cada coisa esquisita, trazidas por pessoas tentando entrar no país”, afirma ela. “Malas cheias de frutas, grãos diversos e até a mandíbula de um animal estão entre os itens.” Esses materiais estão no acervo digital disponibilizado pelo Mapa para ilustrar o estudo da Oxya e podem ser vistos na matéria abaixo:

Veja Também:
chamada materia fabio

 

Caso parecido aconteceu na China, onde mais de 50 espécies exóticas foram encontradas após os Jogos Olímpicos de 2008. No Brasil, um estudo parecido já havia sido realizado pela consultoria durante a Copa do Mundo de 2014. Curiosamente, desde o evento até o ano passado foram encontradas aproximadamente oito novas espécies de pragas exóticas no país. “É difícil atestar exatamente quando as pragas foram introduzidas, mas não descarto que algumas delas tenham chegado junto com o evento”, comenta Regina Sagayama.

 

“O problema de se trazer uma praga exótica é que ela pode não ter inimigos naturais no Brasil, e os estragos serem muito maiores”.

Fábio Kagi, gerente de educação e treinamento
da Andef.

 

Com base na lista de pragas recentemente introduzidas no Brasil, foi observado que o ser humano foi o responsável pela introdução de pelo menos 65% do total. Entretanto, o número de detecções de novas espécies vem aumentando exponencialmente desde a década de 1990 e ultrapassou o número de 50 espécies na última década.

O estudo, encomendado pela Associação Nacional de Defesa Vegetal (Andef), com a parceria de entidades como a Sociedade Brasileira de Defesa Agrícola (SBDA), Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados (Abragrutas) e Associação dos Produtores de Soja e Milho do Estado de Mato Grosso (Aprosoja-MT), ainda destacou os países que mais trazem riscos ao Brasil, devido à quantidade de pragas já detectadas em seus territórios, mas ainda inexistentes aqui. Em primeiro lugar disparado estão os Estados Unidos, que possuem 289 pragas não encontradas no país. Depois vem a Itália, com 205, e a Índia fechando o pódio com 188 pragas. Veja abaixo a lista dos dez principais países e a quantidade de pragas que ameaçam o Brasil:

Pragas olimpiadas

Segundo o gerente de educação e treinamento da Andef, Fábio Kagi, com a proximidade da Olimpíada, a fiscalização deveria ser ampliada e reforçada para garantir a sanidade fitossanitária da principal atividade econômica do país, a agricultura. “É importante lembrar que todas as culturas têm pragas, umas que afetam mais, outras menos, mas todas têm”, reitera. “O problema de se trazer uma praga exótica é que ela pode não ter inimigos naturais no Brasil, e os estragos serem muito maiores que no local de origem.”

O caso da Helicoverpa armigera é exemplar. A lagarta foi detectada logo após a Copa do Mundo, e causou problemas sérios ao país. Segundo Kagi, é difícil comprovar que a temida praga tenha sido introduzida por um turista que veio ao evento, mas a possibilidade não é descartada. “Pode ser uma infeliz coincidência, mas essa praga, que não possui inimigo natural no Brasil, está dando muito trabalho para ser controlada e trazendo gastos elevados ao produtor”, garante ele.

Efeitos na soja

A principal cultura do Brasil, a soja, também está ameaçada com a invasão dos turistas. O estudo da Oxya considerou 23 invasores potenciais. Pelos cálculos da empresa, ao menos 160 dos 249 países que estarão na Rio 2016 apresentaram pelo menos uma espécie de praga quarentenária para a soja ausente no Brasil. Assim como é comum nas Olimpíadas, os Estados Unidos lideram mais uma vez, com 16 espécies exóticas, seguido por China, África do Sul e Austrália, com 15 pragas cada um.

No caso de plantas infestantes ou parasitas, foram consideradas aquelas espécies que, segundo a literatura consultada, são comuns em lavouras de soja e cujas sementes podem entrar como contaminantes. Segundo Neri Ribas, diretor técnico da Aprosoja-MT, essa disseminação de pragas preocupa muito toda a comunidade produtora nacional e é uma questão de segurança nacional. “O intuito principal desse estudo é aumentar o nível de informação das pessoas, conscientizá-las do perigo de se trazer algo in natura ao país”, afirma Ribas. “O que segura este país é a agricultura. Se um monte de pragas entrar, teremos prejuízos sérios.”