Veja como foi o Fórum Soja Brasil, na Expoagro, em Campo Novo (RS)

Evento atraiu muitos jovens interessados no debate sobre a sucessão familiar. Além disso, destacou-se também a importância de o Rio Grande do Sul adotar o vazio sanitário

Daniel Popov, de São Paulo
Pela primeira vez o Fórum Soja Brasil foi realizado dentro de uma das principais feiras agrícolas do Rio Grande do Sul, a Expoagro, organizada pela Cooperativa Tritícola Mista Campo Novo (Cotricampo), em Campo Novo (RS). O evento foi marcado por debates sobre a importância de os produtores gaúchos adotarem o vazio sanitário, as vantagens de fazer a rotação de culturas para altos rendimentos e o futuro da sucessão familiar.

Muito se falou, durante o evento, a respeito do clima e dos impactos que ele causou em diversas lavouras de soja nesta safra. Diante disso dá para entender por que a palestra do pesquisador da Embrapa Osmar Conte chamou tanto a atenção dos produtores que acompanharam o fórum. O tema escolhido, “Sistemas de produção e manejo de solo para altos rendimentos”, tratava exatamente do planejamento antecipado do sistema de produção e os impactos positivos que isso traz a longo prazo.

“O agricultor precisa entender que a lavoura é um sistema complexo de produção, e a rotação de culturas é essencial para a melhora da condição e resistência do solo em dias como os atuais, com excesso ou falta de chuvas. Quem faz esta opção não sente tanto o efeito negativo do clima e acaba conseguindo uma estabilidade produtiva. Isso se deve, basicamente, à dinâmica da água no solo, com mais infiltração e reserva de nutrientes”, afirma o especialista.

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Ele explica que os sojicultores do Rio Grande do Sul ainda pensam exclusivamente no trigo como opção para a sucessão da soja, mas ressalta que outras culturas podem ser mais interessantes e rentáveis.

“Para falar a verdade o trigo não é a melhor opção para os produtores do estado. Outras culturas são mais interessantes, como a aveia, o azevém ou o nabo. É importante o produtor ter uma visão mais ampla do sistema de produção. Às vezes ele não irá retirar renda da lavoura, mas sim ganhos produtivos para a cultura principal. É preciso ressaltar que os ganhos não são imediatos, mas vêm ao longo do tempo”, diz Conte.

Vazio sanitário no Rio Grande do Sul

Além da mudança na rotação de culturas, visando ganhos produtivos, o Fórum Soja Brasil trouxe uma importante reflexão sobre o vazio sanitário no estado. O Rio Grande do Sul é um dos poucos que não aderiu à medida preventiva contra a ferrugem asiática, com a alegação de que o inverno era rigoroso e a doença não sobrevivia.

Segundo a pesquisadora da Embrapa Soja Claudine Seixas, nos últimos anos o clima não tem sido suficiente para conter o avanço da doença, que, inclusive, chegou mais cedo ao estado nesta safra.

“O Rio Grande do Sul não adota o vazio porque o inverno é rigoroso e as geadas acabariam com a doença. Só que nos últimos anos o clima tem sido menos rigoroso, e os relatos de soja guaxa com ferrugem estão chegando mais cedo. Antes eles surgiam em janeiro e este ano começaram em dezembro”, conta Claudine.

Em sua palestra, a pesquisadora relembrou o caso de Mato Grosso, que começou a registrar casos da doença em outubro e, após adotar o vazio sanitário, viu a doença chegar somente após dezembro.

“A Embrapa produz os resultados e mostra a situação. Acho que o estado deveria debater seriamente esta situação, pois isso irá ajudar os produtores. Por lei, o período mínimo para o vazio é de 60 dias. E como eles têm os tais invernos mais rigorosos, poderiam adotar esse tempo mínimo inicialmente”, diz.

Para o diretor executivo da Aprosoja Brasil, Fabrício Rosa, os produtores precisam entender que todo o esforço contra a ferrugem é válido. Apesar de os agricultores do Rio Grande do Sul acharem que não é importante por conta do clima, essa medida pode garantir a existência dos poucos produtos para controle da doença.

“Precisamos estudar essa questão e ver realmente qual o impacto disso dentro das propriedades. A Aprosoja lutou muito para liberar um produto contra a ferrugem, já que o país só tinha dois princípios ativos, e ambos estavam perdendo eficiência. Conseguimos liberar, mas esse produto novo também está perdendo a guerra. E o que podemos fazer? Fazer o manejo adequado para garantir a eficiência. E o vazio sanitário é importante pra isso”, afirma ele.

Outro tema debatido foi a área de refúgio, na palestra de Alexandre Gazolla, doutor em produção e tecnologia de sementes, representando o CIB (Conselho de Informações sobre Biotecnologia). Ele reiterou que 94% das lavouras brasileiras de soja fazem uso de biotecnologia, o que é bom. Entretanto, em uma pesquisa também realizada pelo conselho, destacou que 7 em cada 10 produtores acreditam que as biotecnologias estão perdendo sua eficiência. E a razão é justamente a falta do manejo adequado. Ou seja, a falta do refúgio.

“O Brasil é o segundo país que mais adota biotecnologia no mundo. Temos variedades altamente adaptadas a todas as regiões do Brasil, e isso ajudou no desenvolvimento e avanço da cultura da soja no Brasil”, diz Gazolla. “Precisamos que todos trabalhem na preservação das tecnologias para que elas sigam ajudando no campo.”

Sucessão familiar

Outra preocupação dos agricultores do Rio Grande do Sul é a sucessão familiar. Ainda mais quando as propriedades fazem parte de cooperativas agrícolas. Segundo o presidente da Cotricampo, o grupo tem discutido o assunto há alguns anos.

“Muitos jovens estão deixando o campo, e isso é ruim. Precisamos que esse debate seja cada vez mais recorrente, para dar continuidade à produção de alimentos e renda no campo”, comenta Gelson Bridi. “Planejamos fazer mais encontros com jovens do campo em 2018, para mostrar a importância de ficar no campo.”

Segundo o professor e advogado Alexandre Pasqualini, 70% das sucessões patrimoniais fracassam em todo o mundo. Ou seja, 7 em cada 10. E ele atribui isso a uma atitude fácil de reverter: divisão de responsabilidades. “Não adianta nada ampliar a riqueza e o patrimônio da família. Para que uma sucessão dê certo, é importante manter a família unida. Sem isso, provavelmente a relação acabará em algum tribunal e todo aquele trabalho irá acabar”, diz ele.

O presidente da Ocergs (Organização das Cooperativas do Rio Grande do Sul), Vergílio Perius, comentou que a entidade oferece cursos para ajudar a formar os jovens para a sucessão. Mas ele destaca que os jovens sucessores também querem construir a própria família, e por isso há um cuidado especial nos cursos. “Nossas salas têm, obrigatoriamente, metade de homens e metade de mulheres. E já tivemos até casamento ao final de um dos cursos”, diz Perius. “Queremos garantir que eles tenham tudo que precisam lá no campo e se interessem em ficar.”

Assista abaixo o evento na íntegra:

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